29 março 2009

Sobre Sótãos, Escritórios e Outras Lembranças!

Aproximadamente 400 volumes de livros e revistas que um dia fizeram parte da biblioteca de meu pai estão hoje, por empréstimo à família, à minha frente, mal acomodados nas prateleiras de duas estantes que ocupam toda uma parede do escritório aqui de casa. Por empréstimo, pois ainda são da família, estão aqui porque fiz questão de mantê-los comigo e também porque nenhum dos meus irmãos tinha espaço suficiente para acomodá-los.

Cresci enfurnado no escritório[1] apertado da casa de meus pais, onde se misturavam livros, revistas, mesa para desenho, banqueta, rolos de papel vegetal, escrivaninha, cadeira, uma caixa enorme para guardar as plantas com projetos arquitetônicos, réguas de todo tipo e tamanho e, ocupando quase meia parede, prateleiras lotadas de canetas e penas para desenho, vidros de tinta nanquim, lápis, borrachas e tudo o mais que se utilizava na época em desenho técnico, a maioria acondicionada em caixinhas de metal com tampas de dobradiças, que originalmente embalaram lápis >>LOTUS<<, da Johann Faber. Uma destas caixinhas está aqui ao lado do teclado, com algumas canetas para nanquim com cabos coloridos, e um compasso tira linhas. A última vez que usei uma destas canetas bico de pena foi em meados da década de 70, durante uns três ou quatro dias em que fiquei de molho num quarto do sótão[2] por conta de uma virose qualquer dos tempos de juventude, quando rabisquei uma folha de cartolina que acabou virando um quadro, pendurado na parede atrás de mim.

Ainda hoje estes livros, tão familiares, com capas descoradas, amareladas, muitas delas estragadas pelo uso ou carcomidas pelo tempo – são livros das décadas de 30, 40 e 50 – trazem à memória a lembrança de bons momentos passados naquele canto muito especial da nossa casa, lendo vários destes mesmos livros hoje na minha estante, folheando revistas, navegando pelo mundo e pelo espaço nas páginas dos atlas[3] e devorando Seleções do Reader’s Digest.

Por estes dias, acabei folheando novamente uma daquelas revistas, a Revista Esso, uma publicação bimestral da Esso Standard do Brasil Inc., com Théo de Castro Drummond como Redator-Responsável. A melhor analogia que me ocorre é que ela seria uma espécie de Superinteressante daquela época, com a diferença de haver muitos artigos sobre obras do governo e sobre trabalhos de pesquisa e desenvolvimento da própria Esso. Tenho comigo 19 números, do 3º bimestre de 1956 ao 4º bimestre de 1960, com 7 números faltando neste intervalo. Em média 12 matérias em 24 páginas de folhas grossas, já meio amareladas. O que desencadeou estas memórias foi uma matéria no exemplar do 3º bimestre de 1957 – exatamente da minha idade, portanto – sob o assunto “Pioneiros da Indústria: Aparelhos de Ótica e Precisão”, que transcrevo literalmente:

"Em 1940, um rapaz de Santos (S. Paulo) escreveu ao Pre­sidente da República, apresentando um novo modêlo de telêmetro de depressão se propondo a fabricar aquêle ins­trumento – que até então era importado – para a Artilharia de Costa. Seis meses depois, era chamado à presença do Ministro da Guerra, para explicar detalhes do projeto. E demonstrou tamanha convicção da exequibilidade de seu plano, que voltou à sua terra com ajuda oficial para iniciar o trabalho. Seu nome: Décio Fernandes Vasconcelos.

Surgiu, aí, o primeiro grande problema: o rapaz tinha idéias, tinha mesmo algum dinheiro, mas não tinha onde fa­bricar o telêmetro, nem pessoal especializado. Isso, porém, não seria obstáculo. Décio lembrou-se de que, em 1922, com 13 anos de idade, fabricara no porão da casa de seus pais um rádio-receptor. Por sinal, na época, aquêle aparelho era privativo do Exército e por isso o pai do "inventor" teve de dar explicações à Justiça. Em segui­da, Décio (que tinha um comportamento "diferente" dos meninos de sua idade) foi levado pelo progenitor a um médico, para saber como andavam suas faculdades mentais...

Agora, para fabricar um aparelho ótico que se rivalizasse com o importado, era preciso um pouco mais do que um simples porão. Tratou de mudar-se para São Paulo e comprou oficina, na rua Mauá, onde começou o trabalho. Tempos depois, voltou à presença das autoridades mi­litares, levando debaixo do braço o primeiro telêmetro fa­bricado no Brasil. E o aparelho, submetido à prova, demons­trou ser tão bom ou melhor do que o importado.

Hoje, aquêle moço de Santos possui a única fábrica sul­-americana (e sétima, em importância, de todo o mundo) de aparelhos de ótica e precisão. Ali, sob a supervisão do próprio Décio, perto de quinhentos operários e dezenas de en­genheiros especializados produzem, além do telêmetro de precisão, 81 outros produtos, entre os quais binóculos, lunetas oftálmicas, teodolitos, lentes para projeção de cinemascópio, máquinas fotográficas e o poliópticon – um brinquedo muito interessante e de múltiplas aplicações, cuja licença para fa­bricação na América do Norte já foi solicitada por duas conhecidas firmas especializadas dos Estados Unidos.”

Eis que, ao bater o olho na foto da linha de montagem, algo chamou a atenção: aquelas caixinhas com cara de bonecos de olhos e boca arregalados não me eram estranhas! Pois, ali estava registrado para o futuro a linha de montagem das máquinas fotográficas modelo Kapsa, do tipo caixinha, e eu tenho comigo uma dessas, também herdada de meu pai, embalada em sua caixa original e devidamente acompanhada do seu manual!

Liguei para minha mãe, e ela confirmou que muitas das fotos antigas que ela tem guardadas em álbuns e caixas, foram batidas com esta máquina. Fabricada na década de 50, era robusta e resistente a quedas. De funcionamento simples, apenas três ajustes manuais de abertura do diafragma e duas velocidades de disparo, uma delas também manual, determinada pelo tempo que se mantém o disparador pressionado, e para ver a imagem pelos visores era necessário segurá-la na altura da barriga.

Está em bom estado de conservação e, apesar de um pouco de poeira, nenhum dano aparente em seu mecanismo e suas peças. Acredito que ainda deve bater boas fotos, se encontrar o filme recomendado. E é claro, também precisa descobrir quem o revele! Quem sabe um dia, quando bater novamente a nostalgia de um tempo muito bom, de tantas e tão boas lembranças!


_________________________Notas de rodapé:
[1] – A simples palavra escritório exerce sobre mim um fascínio difícil de explicar. Sempre me lembrou livros, pesadas mesas com muitos papéis, lápis, canetas, luminária de mesa e máquina de escrever que, de uns tempos pra cá, foi substituída pelo computador. Acho estranho uma casa sem escritório, senão uma peça exclusiva, mas pelo menos um canto com prateleiras, livros e uma mesa para trabalho.
[2] – Tenho fascínio também por sótãos, e isso é uma coisa mal resolvida na minha vida! Morei em uma casa com sótão por poucos anos durante a juventude, e depois de adulto morei ano e pouco num quarto de pensão, também no sótão. Depois disso, casa, apartamento e casa novamente, com dois pisos, mas sem sótão. Acabei privando meus filhos de sentir o prazer de dormir num sótão, embalado pelo barulho de chuva em telhas de barro. Terei que conviver com isso para todo o sempre!
[3] – Atlas é caso de obsessão mesmo, tenho vários, desde aqueles da minha infância até os adquiridos mais recentemente, quando imaginei que meus filhos herdariam o gosto. Mas aí apareceu um tal de computador e uma tal de Internet, e nada mais aconteceu como combinado. Eles até folhearam seus atlas escolares, que acabei herdando deles, mas não passaram disso. Pena, também não sentiram o prazer de descobrir o mundo e o universo nas mágicas páginas de um atlas.

16 março 2009

Uma Tirinha no Pedaço [dois]

FAGUNDES & ANACLETO
Clênio Souza, artista plástico, escultor, cartunista, poeta e desenhista, originalmente publicado em O Momento.

08 março 2009

Quem Disse Que Escrever Esclarece?

É comum falarmos uma coisa e as pessoas entenderem outra. Constantemente temos que repetir, chamar a atenção, explicar uma, duas, várias vezes. Às vezes, é como se fôssemos alienígenas, por mais que nos expliquemos menos nos entendem. Bem, na verdade não sei se é assim com todo mundo, mas comigo é. Tenho tendência a ser prolixo nas minhas argumentações ou narrativas. Sinto necessidade de explicar como as coisas chegaram até aquele ponto ao qual me refiro, considero importante situar o objeto da discussão. Essa característica já virou folclore entre meus amigos de convívio mais próximo. Já quando escrevo consigo me policiar, mesmo porque posso pensar o texto como um todo, reler, reescrever, reordenar o pensamento, enfim, trabalhar com calma aquilo que quero exprimir. Este deve ser um dos motivos pelos quais escrevo tão pouco, ou bem menos do que gostaria.
Há poucas semanas, depois de acalorada discussão sobre um assunto muito caro a mim e a um grupo de bons amigos, com quase quatro décadas de convivência, senti a necessidade de registrar no papel aquilo que eu pensava sobre o assunto em questão. Aquela não era a primeira vez que discutíamos, e a cada vez, menos nos entendíamos. Como de certa forma eu fui o pivô da discussão, e de tanto discutirmos meus argumentos iniciais já estavam com sentido completamente oposto à realidade, peguei do papel, ou melhor, do teclado, registrei para a posteridade e enviei por email o meu sentimento sobre os problemas que motivaram nossos desentendimentos, literalmente do tipo discutindo a relação!
Bem, aqui entra o motivo do post. Enquanto escrevia aquela carta aberta, numa verdadeira batalha com as palavras para que não restasse uma única possibilidade de dúvida quanto ao meu posicionamento, lembrei de alguns autores que, por competência e genialidade, escreveram com o objetivo oposto, ou seja, para não esclarecer, no intuito de protestar, como fez Zé da Luz no início do século passado, quando escreveu o poema Ai! Se Sesse!, dizem, “... de tanto ouvir as pessoas dizerem que para escrever um poema de amor deveria fazê-lo com o português correto e palavras rebuscadas...”, ou com a clara e manifesta intenção de instigar os sentimentos [como costuma dizer um professor de literatura que conheço, “... para dar um soco na boca do estômago do leitor!”], como fez Jorge de Sena [mais sobre ele aqui] ao escrever uma obra prima chamada Quatro Sonetos a Afrodite Anadiómena.
Nas palavras do autor, o significado semântico das palavras nos sonetos dá lugar à percepção de sentidos pela imagem e pela sonoridade, e ele não poderia ter sido mais feliz em seu objetivo. Claro que as pessoas os percebem de maneiras distintas, enquanto alguns se emocionam ao lê-los, como eu, outros se valem da lógica ou da lingüística para tentar entendê-los. Não importa. Não quero aqui discorrer sobre esta obra, que já foi objeto até de dissertação de mestrado, centenas de outros já o fizeram com muita propriedade. Eu a transcrevo apenas como forma de registro do que se pode fazer com as palavras quando se sabe escrever.
I
PANDEMOS
Dentífona apriuna a veste iguana
de que se escalca auroma e tentavela.
Como superta e buritânea amela
se palquitonará transcêndia inana!


Que vúlcios defuratos, que inumana
sussúrica donstália penicela
às trícotas relesta demiquela,
fissivirão boíneos, ó primana!


Dentívolos palpículos, baissai!
Lingâmicos dolins, refucarai!
Por manivornas contumai a veste!


E, quando prolifarem as sangrárias,
lambidonai tutílicos anárias,

tão placitantos como o pedipeste.
II
ANÓSIA
Que marinais sob tão pora luva
de esbanforida pel retinada
não dão volpúcia de imajar anteada
a que moltínea se adamenta ocuva?

Bocam dedetos calcurando a fuva
que arfala e dúpia de antegor tutada,
e que tessalta de nigrors nevada.
Vitrai, vitrai, que estamineta cuva!

Labiliperta-se infanal a esvebe,
agluta, acedirasma, sucamina,
e maniter suavira o termidodo.

Que marinais dulcífima contebe,
ejacicasto, ejacifasto, arina!...
Que marinais, tão pora luva, todo...
III
URÂNIA
Purília emancivalva emergidanto,
imarculado e róseo, alviridente,
na azúrea juventil conquinomente
transcurva de aste o fido corpo tanto...

Tenras nadáguas que oculvivam quanto
palidiscuro, retradito e olente
é mínimo desfincta, repente,
rasga e sedente ao duro latipranto.

Adónica se esvolve na ambolia
de terso antena avante palpinado.
Fimbril, filível, viridorna, gia

em túlida mancia, vaivinado.
Transcorre uníflo e suspentreme o dia
noturno ao lia e luçardente ao cado.
IV
AMÁTIA
Timbórica, morfia, ó persefessa,
meláina, andrófona, repitimbídia,
ó basilissa, ó scótia, masturlídia,
amata cíprea, calipígea, tressa
de jardinatas nigras, pasifessa,
luni-rosácea lambidando erídia,
erínea, erítia, erótia, erânia, egídia,
eurínoma, ambológera, donlessa.
Áres, Hefáistos, Adonísio, tutos
alipigmaios, atilícios, futos
da lívia damitada, organissanta,
agonimais se esforem morituros,
necrotentavos de escancárias duros,
tantisqua abradimembra a teia canta.
E no que deu o que escrevi? Pois, as coisas ainda não ficaram totalmente esclarecidas! Mas, pelo menos, saio da empreitada com um consolo e uma certeza. Consolo, por saber que, a qualquer momento, posso dizer que as minhas palavras estão lá, escritas, preto no branco, para que não restem dúvidas. E a certeza que ainda tenho um longo caminho a percorrer até aprender a me comunicar com mais clareza.

PS.: Se me dão licença, vou ali no canto ler Machado de Assis e outros notáveis para ver se aprendo alguma coisa. Pode ser que eu demore um pouco a voltar...

22 fevereiro 2009

Uma Tirinha no Pedaço [um]

FAGUNDES & ANACLETO
Clênio Souza, artista plástico, escultor, cartunista, poeta e desenhista, originalmente publicado em O Momento.

Clênio Souza, artista.

Artista plástico, professor de artes, escultor, cartunista, poeta e desenhista, Clênio Tadeu Paz de Souza nasceu em 1958 em Urubici. No início dos anos 60 sua família mudou-se para Lages, SC. De origem humilde, começou a desenhar aos sete anos de idade quando, ao acompanhar seu pai ao trabalho, numa madeireira, ganhou alguns pedaços de carvão. Foi o suficiente para que o mundo das cores e das formas ganhasse vida através de sua imaginação. Pintor autodidata, tornou-se um dos nomes mais conhecidos no surrealismo do Estado, e teve em Martinho de Haro um de seus maiores incentivadores. Seus quadros já foram expostos nas capitais e em várias outras cidades do sul do país, em cerca de 100 exposições individuais e coletivas. Faleceu na manhã de segunda-feira, 29 de maio de 2006. (Fonte: biografia escrita por Raul Arruda Filho)

Foi exímio caricaturista. Segundo relato de um amigo, era comum Clênio participar de reuniões nas quais passava o tempo rabiscando em papéis e, ao final, vários participantes viam-se retratados nos traços firmes inconfundíveis do artista.

Um de seus trabalhos como cartunista foi a criação dos personagens Fagundes & Anacleto, publicados originalmente no hebdomadário O Momento. Com traços fortes e rústicos, registrou semanalmente em apenas três quadros a vida pitoresca de Fagundes, um gaúcho bronco e beberrão, mais grosso que dedão destroncado - grosso tipo bicho, nas palavras do seu criador, e seu inseparável parceiro de balcão de boteco, Anacleto, um porco esperto prá mais de metro. A simplicidade e atenção a pequenos detalhes são características marcantes do seu desenho.

Nas tirinhas estão representados costumes regionais, lugares e personalidades locais, incluindo o próprio semanário que o hospedava, palavreado gaudério [com erros de grafia e concordância], fatos insólitos que só acontecem em balcão de bar, e todo tipo de grosseria que um legítimo chiru casca grossa possa praticar!

Nasce hoje neste espaço a série Uma tirinha no pedaço, com as aventuras e as desventuras de Fagundes & Anacleto, grosso tipo bicho!

01 janeiro 2009

Qualidade de Vida – ou ‘Os Ratos da Cidade Vão ao Campo Passear!’

É sábado, 27 de dezembro, início da tarde. A estrada sinuosa forrada de pedras, cortando um campo amarelado de trigo recém colhido, obriga um ritmo lento e cuidadoso. A ansiedade agora é de chegar o quanto antes, para aproveitar melhor o fim de semana. Saindo da estrada logo depois da ponte e tomando um caminho estreito em subida, quase uma trilha no meio de campo e matos, deixamos para trás esta vista do trigal ao longe, que disputa espaço com plantações de pinheiro americano. Nada é perfeito. É pena, pois nesta região de uma beleza sem igual, o pinus se alastra como peste.

Junto conosco, minha esposa e eu, estão nossa filha mais nova e um grande amigo, irmão de coração, momentaneamente desgarrado da sua família. Estamos a caminho do sítio de outro bom amigo que, por excesso de confiança, há tempos nos deu cópia das chaves dos portões que fecham os terrenos vizinhos que temos de atravessar. Da casa não nos deu cópia da chave porque a porta permanece fechada, mas não trancada. Quem chega, gira a maçaneta e entra. Ele e a esposa ficarão por lá até início de janeiro e nos convidaram a aparecer, mas não sabem que estamos indo. Reforçamos a despensa e a cerveja já vai no isopor com gelo. Nem precisa avisar, somos sempre bem vindos.
Estes momentos no sítio, que chamamos de estância, não têm preço. O valor da paisagem, da natureza intacta, da boa companhia, da conversa fácil, descompromissada, séria ou bem humorada, regada a café, cerveja gelada ou chimarrão, não se mede nem se conta. São momentos que existem e pronto. Nós os vivemos, usufruímos, eles nos alimentam e nos unem, e crescemos como gente e como amigos. Simples assim.
Ainda no sábado, final de tarde, quase sete horas, uma caminhada de 20 minutos até a cachoeira para desenferrujar as juntas. O sol estava baixo e não iluminava mais a cachoeira [por isso a má qualidade das fotos], com seus paredões de pedra no formato de uma ferradura e a queda d’água com uns 9 metros de altura. Água rala, muito tempo sem chuva consistente, mas ainda assim uma bela vista. Ajeitar-se nas pedras e pensar na vida ouvindo a música da cachoeira foi um convite pro cochilo, que não aconteceu por causa das pedras jogadas na água para molhar os incautos! Coisa de crianças cinquentonas... Em tempos normais, as pedras onde eu me encontrava ficam cobertas pela água, e o espetáculo da cachoeira é de extasiar.

No domingo de manhã, sob um sol cozinhante, o trabalho pesado de reforçar o portão antigo de madeira bruta pintada de branco e substituir os palanques que o sustentam, e esticar os fios de arame farpado. Terminamos exaustos, mas satisfeitos pelo serviço bem feito. À tarde, depois de um arroz com galinha preparado no capricho pelo nosso amigo desgarrado, um banho de chuva – coisa de crianças, claro – que caiu só o suficiente para amenizar um pouco o calor.

A volta para casa foi como sempre é, um tanto melancólica, pois sempre queremos ficar mais um pouco, e também muito tranqüila, pela satisfação da saída da rotina, do convívio amigo e fraterno, e da paisagem de um fim de tarde de verão, que proporciona, entre tantas coisas, um olhar diferente sobre aquela imagem da vinda no dia anterior.

Como sempre se despede o Brancaleone, um assíduo freqüentador da blogosfera, para fazer inveja a nós, ratos da cidade, só resta dizer:
— Sorry, urbanóides!

13 dezembro 2008

Noite de Autógrafos

Na noite de sábado, vinte e nove de novembro, no hall do SESC, aconteceu o lançamento do livro "ENTRE SEM BATER", uma coletânea de 28 textos de 14 autores, alguns de primeira viagem como eu, e outros nem tanto. Para todos nós, escritores iniciantes, um incentivo ao exercício da escrita, e para alguns, quem sabe, também o início de uma profícua carreira literária.

No livro, no capítulo Histórias de Um Coronel de Estância, estão publicados os episódios 2 e 3 de A Saga do Cajuru, com as aventuras e desventuras do Coronel Arrudão, o seu cão Traíra e seu fiel peão Vassourinha pelos pagos do Cajuru.

A coletânea foi organizada pelo professor de literatura da UFSC e escritor Manoel Ricardo de Lima, que também foi um dos revisores e o orientador dos três encontros realizados a partir do final de junho.

Esta obra é fruto do Programa SESC de Formação de Escritores, que “privilegia a experimentação e as dinâmicas da escrita literária, sem apresentar receitas prontas. Unindo teoria e prática, o curso prevê a participação dos alunos em todo o processo, como a escrita dos textos, disseminação da produção, envolvimento da mídia e lançamento do Caderno de Autoria, como resultado do trabalho. A Coleção Caderno de Autoria surge em consonância com o cenário cultural brasileiro e com as diretrizes do Departamento Nacional do SESC enquanto estímulo à produção, difusão dos bens culturais e incentivo a novos artistas” [Sesc/SC].

Na foto, o momento em que escrevo a dedicatória à minha mãe, que sorria orgulhosa pelo feito inédito do seu filho mais novo! Ao fundo, minha irmã, atenta, organiza a fila para os autógrafos! :-D

23 novembro 2008

As Coisas Como Elas São

A maioria das pessoas que conheço passa a vida guardando, e carregando para cima e para baixo montanhas de tralhas que adquiriu por achar que precisava daquilo, alimentando a cultura predatória do consumo, e não se desfaz de nada por achar que um dia pode precisar. Raramente precisa. Não vale a pena tanto esforço, tralhas atravancam a vida. Livrar-se delas abre espaço na casa e na cabeça. Deixa o ambiente mais aberto, mais limpo, e a vida como um todo também fica mais leve.

Eu sou uma dessas pessoas. Passei toda a minha vida arrastando um fardo desnecessário, preocupado em demasia com um futuro de provável carestia. Esqueci de acreditar na minha própria capacidade de suprir as minhas necessidades, e da minha família, quando elas surgissem. Há algum tempo comecei a mudar minhas atitudes. Aos poucos, afinal, não tem como radicalizar chutando o balde e mudando em alguns dias um hábito cultivado por 40 ou 50 anos. Já consigo fazer o ‘passeio socrático’ e à noite dormir sem traumas, arrependimentos, nem culpas. Pelo contrário, fico satisfeito por não perder o controle sobre aquilo que eu realmente preciso. E tenho necessitado de cada vez menos coisas!
Acredito cada vez mais na premissa de tenha ou faça o suficiente: trabalhar o suficiente para garantir conforto e segurança suficientes para nós e nossa família, ter anseios e ambições suficientes para não estagnar em depressão e motivar-nos a buscar sempre o melhor, mas sem transformar esta ambição em um fim em si mesma, adquirir apenas o suficiente para as nossas necessidades... e, como conseqüência, repensar tantas outras coisas do nosso dia a dia, como reduzir o consumo para reduzir o lixo, consumir melhor para reaproveitar e reciclar o descarte gerado, repensar hábitos para racionalizar o uso dos recursos naturais...
É complicado, às vezes. Mas perfeitamente possível, basta vontade e acreditar que isso é bom para mim e para o mundo. O vídeo abaixo ajuda a conhecer melhor a origem, destino e consequência do ciclo produtivo e de consumo, e serve de alerta para quem ainda se importa com o que pode ser feito. O vídeo é um pouco longo, mas muito didático. Você não vai perder o seu tempo, tenho certeza!

18 outubro 2008

8. O Coronel e o Sumiço do Vassourinha

(Esta é uma obra de pseudo-ficção. Qualquer coincidência com personagens abstratos, fatos inventados e lugares imaginados não será mera semelhança!)

O coronel Gumercindo Neto virou à esquerda logo depois da ponte e parou a camionete em frente ao portão de arame farpado que fecha a estrada que leva à estância. A noite estava quente e escura, nublada, sem lua. Ficou ruminando as idéias, olhos perdidos lá adiante onde a luz dos faróis iluminava o capim alto e o seu cão correndo, as orelhas compridas subindo e descendo parecendo as asas de um pato tentando levantar vôo, e sumindo na curva do caminho estreito. Era sempre assim. O Traíra fazia todo o percurso da ponte até a estância correndo e latindo, e fuçando em todos os buracos e macegas, e mergulhando nas sangas e poças d’água. Chegava primeiro e recebia o coronel latindo e rosnando como a um estranho. – Cachorro esquisito... – pensou. Estranhou a demora do Vassourinha para abrir o portão, o terceiro até ali. Até a estância, mais três. Pôs a cabeça para fora:
— Vassourinha! Tá dormindo, diabo?
Olhou a carroceria pelo vidro traseiro da cabina, mas estava muito escuro e não viu ninguém. Chamou de novo pela janela, e nada.
— Vou te acordar no tabefe, seu traste! – falou alto, enquanto desembarcava e procurava pelo Vassourinha no assoalho da caçamba, mas só achou um garrafão com um pingo de água de privada e os sacos de sal e de ração que trazia para o gado.
— Mas cadê ele? – resmungou, olhando em volta.
— Vassourinha! Ô, Vassourinha! – começou a chamar enquanto procurava em volta da camionete, na estrada, e nos matos da beira da estrada.
— Deve estar mijando... E se caiu no rio, aquela anta?
Foi até a ponte, e cuidou prá ver se escutava algum barulho diferente na água. Nada. Começou a ficar preocupado. Voltou à camionete e manobrou devagar na estrada até dar uma volta completa, procurando o peão com cuidado até onde a luz alcançava. Embicou novamente em frente ao portão, baixou os faróis, e tentou se concentrar no que fazer. O Vassourinha simplesmente havia sumido! Ele agora estava, realmente, muito preocupado.
Não era sem razão. Vassourinha era viciado em água de privada já de longa data. No terceiro copo desembestava a pregar a palavra de Deus empoleirado num cupinzeiro – que insistia em dizer que era dele – dirigindo-se a uma multidão de pecadores que só existia em seu delírio! De acordo com uma bruxa velha, benzedeira, a quem o coronel recorre de vez em quando, “... puis, se a cachaça empedra os figo e endurece os joeio, água de privada cozinha os miolo e desinvereda as idéia! ”.
Há uns três anos Vassourinha passou uma semana internado no hospital, abaixo de sedativos, por problemas causados pelo seu vício. Naquele período, o coronel e alguns dos seus amigos se revezaram cuidando do seu peão durante as seis noites do internamento para poupar os seus pais, que o atendiam durante o dia. Todo o tempo, alheio ao mundo real, Vassourinha viveu uma vida só sua, rica em detalhes, com muita imaginação e aventuras. Teve de tudo. Desde dormir sentado, com um olho fechado e o outro arregalado, o que deixou o doutorzinho casca grossa de cabelo em pé, e pedir pro arrumadinho de olho azul sair da frente para ele poder espremer os bernes da Quilemeio, sua vaca de estimação, até achar que seu pé direito debaixo do cobertor era o celular que havia perdido, encostá-lo na orelha e ligar para o advogado para falar da sua questã na junta. Divertiu-se com o alvoroço do bando de macacos pendurados nas árvores que cresciam dentro do quarto, e rasqueteou o rosilho montado pelo bostinha cola fina, que foi visitá-lo entrando a galope pela parede à direita da cama. Sob os cuidados do enrugadinho transcendental, abriu valetas nos corredores e cercou o paciente da cama ao lado da sua com palanques de eucalipto besuntados com óleo queimado ‘... prá proteger da umidade, do jeito que o coronel gosta’.
Mas o que ele mais fez foi discutir com alienígenas, funcionários públicos do planeta Seh Plan, o oitavo do sistema Preh Feyt Hurah, na constelação Lah Gehns. O peão argumentava aos burocratas, categórico, que não embarcaria na nave estacionada flutuando ao lado da janela do quarto, porque a papelada estava somente em quatro vias, deviam ser cinco, e faltava o carimbo do chefe, ‘... sem carimbo não embarco’. Enquanto isso, na beira da porta da nave, um alienígena com olhos puxadinhos e cara de dono de lavanderia enchia copos enormes com água de privada fresquinha e oferecia ao Vassourinha, que salivava e choramingava ‘... mas eu não posso, entendam, tá faltando o carimbo...’. Esta discussão era tão freqüente e com tantos detalhes, que o coronel acabou ficando em dúvida se era só delírio mesmo. Depois que saiu do hospital, o Vassourinha melhorou bastante fisicamente, mas a cabeça deu uma baqueada. Volta e meia, durante a pregação divina lá no cupinzeiro, os alienígenas reaparecem e o peão titubeia, gagueja, e já não discute com tanta firmeza como dantes. Algumas vezes até diz: ‘Então quero ver seu chefe!’.
Um arrepio sacudiu o coronel, que começou a tremer incontrolavelmente e, todo atabalhoado, saiu da camionete testavilhando em círculos, ligando várias vezes para a estância até achar um lugar onde o celular desse sinal:
— Tetê de Deus! – gritou, quase aos prantos – O Vassourinha foi abduzido!

— Ora, homem, você não acredita realmente nessa bobagem, não é?
Tetê está em pé, na cozinha, e à sua frente, sentado à mesa e afundado nos cotovelos, está o coronel, que mal consegue segurar uma xícara com chá de camomila que ela preparou prá acalmar o homem.
— Era só o que faltava, essa história de disco voador e ET carregando o Vassourinha! E justo o Vassourinha, com tanta gente importante dando sopa por aí? Vai ver, ele pulou da camionete no meio do caminho e você nem viu!
— Mas de que jeito, mulher, se ele abriu o portão que tem antes da ponte? E eu vi ele voltar para a carroceria, eu juro que vi...
E não adiantou Tetê argumentar. Depois de umas horas desistiu e foi se deitar. O coronel naquela noite não dormiu, e até quase amanhecer andou dum lado pro outro na casa feito alma penada, arrastando as suas correntes, lamentando os seus erros e se arrependendo das suas culpas. Ah!, se pudesse voltar atrás e tratar melhor o seu peão, talvez ele não tivesse ido embora com aqueles ET’s... Tetê também não dormiu. Nunca tinha visto seu marido daquele jeito, aquele ataque de remorsos, o vai-e-vem pela casa, os resmungos, as lamúrias, os suspiros e os choramingos do coronel deixaram-na preocupada. Não com a saúde do coronel, claro que não, pois ele era socadinho mas tinha saúde, era outra coisa que a incomodava. Todo aquele desatino só por causa do Vassourinha não era normal, devia haver alguma coisa mais que ela deveria saber, e ainda não sabia. A história estava muito mal contada, e naquele momento uma pulga aninhou-se em seus cabelos, atrás da orelha, trazendo consigo uma maçaroca de minhocas que se espalharam pela sua cabeça, acabando com seu sossego.
Já era dia quando o latido do Traíra e um relincho pros lados da porteira interromperam os seus pesadelos. Os dois haviam apenas cochilado depois de uma madrugada inquieta, já quase amanhecendo o dia, a Tetê embolada nas cobertas reviradas e o coronel sentado ao lado do fogão, babando emborcado na chapa fria. Pôs-se de pé num sobressalto, sem saber direito onde estava, e num pulo alcançou a varanda. Parecia que não dormia há semanas. De longe, o cavaleiro acenou e o cumprimentou:
— ‘Dia, coronel.
O peão do seu primo trazia na garupa uma figura que o coronel reconheceu na hora.
— Vassourinha! Vassourinha, você voltou! – gritou e desembestou desatinado em direção aos homens montados na égua Cheirosa, que subia a passo o caminho que levava à casa. Ainda correndo, metralhou:
— Como foi que conseguiu escapar? Eles te machucaram? O que foi que eles te fizeram, homem? Como eles são? O que eles queriam? Tiraram alguma coisa de você? Um rim, um pedaço do teu fígado empedrado para estudo, uma mecha dos cabelos? Cadê a nave? De onde eles vieram? Fala, homem, não agüento a curiosidade, como foi que tudo aconteceu?
O cavaleiro segurou a Cheirosa e gaguejou, assustado com a correria do coronel:
— Ih!, seu coronel, não tô entendendo o que o senhor tá falando... encontrei o Vassourinha dormindo no fundo daquele valão perto da ponte, a par do portão de arame farpado. Tô indo em direção da ponte quando ouvi um ronco, até a égua assustou, achei que era leão baio... E olha, seu coronel, tava assim de urubu no pinheiro que tem ali do lado. Deu trabalho tirar ele lá de dentro, tive que puxar com a Cheirosa! Ele me disse que caiu no valo ontem à noite, quando desceu da camionete prá abrir o portão, seu coronel. Pelo jeito nem deu tempo de gemer, já caiu dormindo...
O manotaço do coronel no bico da bota quase arrancou a perna do Vassourinha, que dormia encostado no peão, e assustou o animal.
— Seu estrupício! – trovejou o coronel – Eu aqui na maior aflição desde ontem, não preguei o olho a noite toda, de preocupado, e você vem me dizer que passou a noite roncando no valo? Seu traste! – outro manotaço quase derrubou o Vassourinha do lombo da égua – E a história dos alienígenas, o que é que você me diz? Hein? Hein? A nave na janela, a papelada sem carimbo? Vai, seu bosta, desembucha! Seu incompetente, nem prá ser abduzido serve! Vamos, homem, desembucha!
O Vassourinha, do alto da montaria, olhos vermelhos piscando em câmera lenta, resmungou:
— Mas, coronel, do que é que o senhor tá faland... uuuggooóóóÓÓÓ!!! – e despejou numa golfada, do narigão adunco às botas do Arrudão, o garrafão inteirinho de água de privada que havia bebido na noite anterior na carroceria da camionete, empestando o coronel com o mais grudento, pestilento e tenebroso fedor de latrina jamais sentido naquelas bandas do Cajuru!
Bem feito! Não mandou desembuchar? Pois, então!
Quanto ao valo, até hoje é conhecido por todos na região como “o valo do Vassourinha”, batizado numa solenidade de descerramento de placa organizada pelos amigos do Arrudão, com direito a gaiteiro, lambisco e tudo mais, devidamente registrada em fotografia.
Apesar da insistência, o coronel não compareceu ao evento!

16 outubro 2008

O Discurso

Discurso proferido na solenidade de formatura do Curso de Ciência da Computação - Sociedade Lageana de Educação. Lages, SC, 08 de março 2003.

É uma grande honra representar meus colegas de curso, e do alto deste palco dirigir a palavra a todos os presentes. Este momento representa muito mais que uma simples formatura. Este é um momento especial em nossa vida pessoal e representa um marco em nossa vida profissional que se inicia.

Senhores, esta é a solenidade de formatura da primeira turma do Curso de Ciência da Computação, o primeiro curso superior da Facvest!
Num país sem tradição de investimento em educação, e menos ainda em pesquisa como é o Brasil, nosso pioneirismo mistura-se ao pioneirismo deste empreendimento corajoso, que é a construção e consolidação de um centro universitário numa das regiões mais pobres do estado. Nossa cidade não se destaca na economia, mas está ao lado das mais importantes cidades do estado no quesito educação com 3 instituições de curso superior que nos fazem pólo educacional da extensa região do planalto catarinense. Um país que não investe na educação perde a soberania, a credibilidade e a esperança de uma vida e um país melhor para seus filhos e netos. Sem a educação nos faltarão as idéias, a confiança e o orgulho de ser o que somos e conseqüentemente perderemos nossos sonhos, substância de que somos feitos e que nos impulsionam e nos fazem seguir adiante e lutar por nossos ideais. Nosso país precisa acreditar e investir na educação de qualidade para seu povo florescer como uma grande nação no futuro.
O futuro nunca é incerto para aqueles que sonham. Com a Facvest plantou-se uma semente cujos frutos engrandecerão seus idealizadores, seus mestres e seus alunos, e farão com que nossa região seja geradora e celeiro de conhecimento, e nós, seus frutos, estamos construindo o futuro desta instituição. Aliás, já somos seu futuro.
E mais que isso: somos os sobreviventes dos 81 alunos que iniciaram o curso em setembro de 1998. Sobrevivemos a noites mal dormidas, a noites não dormidas, a frustrações, inseguranças, sobrevivemos até aos poucos momentos de lucidez em meio à loucura de trabalhos, provas, programas que não rodavam, nos quais nos perguntávamos: onde foi que eu me meti? Mais do que ninguém, a Ciência da Computação nos ensina, a duras penas, que verdades são efêmeras e mutáveis. Que fria e exata deve ser nossa ferramenta de trabalho, não nossa forma de pensar. Mais do que ninguém, a Ciência da Computação nos ensina que devemos conhecer o cálculo, mas nossos clientes são pessoas, não números. E que a tecnologia está a serviço da vida, deve prover, facilitar, proteger, e que o homem é seu criador, não sua criatura.
Hoje, muitos podem montar computadores, editar textos, até desenvolver programas, mas poucos podem projetar redes, administrar bancos de dados ou compreender as necessidades dos clientes e desenvolver soluções apropriadas. Se a tecnologia facilita o uso de computadores a qualquer pessoa, é porque cientistas da computação estudaram, pesquisaram e trabalharam arduamente para isto. Este agora também é o nosso trabalho.
Somos sobreviventes e vitoriosos.
Nada em nossa vida é por acaso, e esta vitória nos custou muito. Ela não caiu do céu, nem nos foi ofertada de bandeja. Por isso temos que valoriza-la. Por isso precisamos a todo custo fazer com que a Facvest seja respeitada como uma instituição que oferece ensino de qualidade, para que nosso diploma também seja valorizado e respeitado. Esta é uma tarefa conjunta: de um lado a instituição oferecendo as condições necessárias para a qualidade no ensino e na pesquisa, e de outro, alunos também comprometidos com um aprendizado de qualidade, e com uma pesquisa séria. Este é o nosso desafio, graduandos e bacharéis: fazer a nossa parte, buscar sempre o melhor de nós, dedicar ao nosso trabalho desvelo de obra-prima, para que nossas obras reflitam qualidade, confiança e segurança. Assim, com certeza teremos orgulho de nossos diplomas, e tudo o mais virá por acréscimo.
Falando em vitória, é preciso dizer que ela não é somente nossa. É também de todos os que conviveram conosco nestes 9 semestres e com seu apoio incondicional participaram do nosso esforço em chegar até aqui: nossa família, nossos amigos, nossos professores. Mas principalmente, nossa vitória é de pessoas muito especiais para nós, porque começaram conosco esta jornada e por um motivo ou outro não estão neste palco. São os colegas que sentaram-se ao nosso lado, partilharam trabalhos, orientaram nossas dúvidas, resolveram problemas, e se dependesse de nós estariam aqui em cima conosco. Nominando alguns poucos, quero homenagear a todos eles: Lawrence, Andréia, Patrick, Pelego, Cristiano, Alexandre, Emílio, Zóio, William, Leslie, Rondinele, obrigado a todos, estaremos em suas formaturas, nossa vitória também é de vocês.
Aproveitando-me do fato de ser o orador, peço a todos que por favor perdoem meu egoísmo, mas falarei agora um pouco sobre mim. Quero compartilhar com todos a emoção que senti há quase cinco anos quando fui acolhido por estes meninos e meninas como se fosse um deles, como se fizesse parte da turma deles desde sempre. Egoisticamente, quero dizer a todos que muito cresci como pessoa e como cidadão, alimentado pelo convívio diário com criaturas como estas, de corações tão generosos. Quero revelar que o tempo em sua marcha inexorável deixou marcas em meu rosto, mas também permitiu que meu coração remoçasse pela alegria cativante de seus espíritos juvenis. Que tive ampliados meus horizontes pela visão aberta e sem medos destes jovens lutadores, e renovada minha crença num futuro melhor para nossos filhos e netos pelos sentimentos de justiça e fraternidade destes jovens cidadãos. Sem pudor, confesso que tive alimentado meu ânimo e vigor pela sua mocidade impetuosa, e assim busquei a força que necessitava para poder acompanhá-los. Alimentei minha alma e meu intelecto com suas sapiências e conhecimentos, e assim consegui a serenidade e o raciocínio que me tornaram um igual. Naquilo que somos, temos um pouco de cada um, e de todos. Cada um de nós, a seu modo, contribui com o que tem. E de vocês, tenho o que vocês têm de melhor. Para mim é uma honra e um privilégio tê-los como amigos.
Acreditem, daqui a muitos anos ainda falaremos da quietude e sabedoria do Elias, sempre nos surpreendendo com a entrega dos trabalhos na data certa, da esperteza e da paixão vascaína do Gilberto divertindo a turma do fundão (deixe quieto), da timidez e do capricho da Andréa, com sua presença calma e sem malícia, e da amizade e lealdade do Luís entretendo-nos com suas histórias (ele é estranho, mas muito divertido). Ah! E com certeza também falaremos com saudade daquele fantástico churrasco, oferecido pelo Luís, ao pé de uma cachoeira lá em Urubici. Foi ótimo, vocês lembram?
Como primeira turma do Curso de Ciência da Computação da Facvest sempre abrimos caminhos, e continuaremos a fazê-lo, com certeza. Saímos daqui com a sensação do dever cumprido, do sonho realizado. Que possamos honrar a educação e a dedicação que recebemos de nossos pais. Que possamos ser bons exemplos para a sociedade, como pessoas íntegras e como profissionais éticos e honestos.
Hoje tudo termina, e no entanto estamos apenas começando...
Parabéns e boa sorte a todos nós. Muito obrigado!