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19 abril 2012

Dia do Índio: Somos Todos Parentes?

Por Carlos Henrique Magalhães e Silva

Minha mãe é uma índia da etnia Wapixana, nasceu na maloca do Xumina, ao lado da maloca da Raposa, no extremo leste da Terra Indígena da discórdia entre brancos e índios: a Reserva Raposa – Serra do Sol, em Roraima, que ganhou espaço na mídia nacional por virar objeto de antagonismo entre partes envolvidas e interessadas e outras nem tanto! Digo isso porque a discussão envolveu, na época, inclusive pessoas cujo único propósito era a autopromoção.

Quando me pego refletindo sobre isso é porque carrego, talvez, um sentimento de culpa de não ser completamente solidário com a causa indígena e porque talvez o que restou de índio em mim corresponda somente à carga genética que herdei. Minha mãe ainda cultiva alguns costumes completamente compreensíveis de sua ascendência, apesar de hoje já ser inteiramente urbanizada. Ainda gosta de comida apimentada ao extremo, comer carne de sol com xibé (farinha de mandioca misturada com água ou leite) e peixe todo santo dia, entre outros; mas também gosta da programação da TV por assinatura, que julga mais divertida, e nem pensa numa vida sem luz elétrica e água gelada. Será que existe algum problema nisso?

Li recentemente uma reportagem onde um dos seguidores dos irmãos Vilas Boas relata que após uma ausência de 15 anos voltou ao Xingu e se surpreendeu com os antigos amigos índios em roupas “brancas”, camisas e calções da Seleção Brasileira de futebol, e perguntou: “Vocês abandonaram seus costumes de andarem nus e agora vestem as roupas dos homens brancos?” e lhe responderam: “E você, porque não usa mais as roupas do tempo de Cabral?”. Creio que o amigo índio quis dizer é que não existe nada de corrupto em assimilar algo que lhe traga mais conforto. Uma coisa é a preservação dos costumes e da cultura, da medicina, da culinária, dos ritos festivos e crenças, etc., e outra completamente diferente é abrir mão do crescimento que vem da miscigenação e do usufruto daquilo que queremos e gostamos. Não existe nada de errado em usar o Google ou outro meio de pesquisa da Internet e nem em ter opção de escolha na programação da TV por assinatura.

Sou suspeito, no entanto. Ao mesmo tempo em que me apego ao sentimento preservacionista do índio insistente em mim, não consigo abrir mão das benesses da urbanidade. Meu espírito sangra com as notícias de não sei quantos campos de futebol de matas virgens dão lugar às plantações mecanizadas por dia, que assisto nos telejornais, porque estou convicto que poderíamos viver com menos. Já pensaram que existem plantações de arroz na China que são do mesmo tamanho há milhares de anos?

Não tenho nenhuma dúvida de que os nativos brasileiros têm paixão pela sua terra, e que cuidam dela com muito mais zelo que a maioria. Isso é próprio do indígena: pescar só o que vai consumir, preservando os estoques pesqueiros na certeza de aquilo poderá faltar no futuro caso seja explorado em demasia; caçar só o suficiente para o sustento da família, na firme certeza de agindo assim suas fontes de proteínas estarão garantidas; desmatar somente a parcela que a natureza não reclamará, enfim, se orientar pela certeza que seus descendentes também têm o direito de usufruir dos recursos naturais que ele mesmo já desfruta. Isso não é a ideia de Sustentabilidade?

Ainda não me dei por derrotado. Sou naturalmente otimista! O respeito que tenho por essas ideias me guia na certeza que podemos fazer algo melhor por nosso planeta. Que poderemos dormir mais tranquilos sem ter pesadelos com tsunamis, enchentes, quedas de barreiras, neve nos trópicos e toda sorte de esquisitices de alterações climáticas (e tudo resultado da intervenção desajeitada do homem). Poderemos sonhar com um futuro melhor se ressuscitarmos o espírito preservacionista que um dia todos tivemos, resgatarmos o índio primitivo de cada um, pois se eles estavam aqui antes de todos, é razoável pensar que de algum modo todos somos parentes. Enfim, ser um pouco índio todo dia e não somente no dia 19 de abril.

Carlos Henrique Magalhães e Silva é gerente geral da Agência Asa Branca, da Caixa Econômica Federal, em Roraima.

Publicado in: Jornal da Caixa (intranet).

31 outubro 2007

Lages, Trânsito Sem Lei

Onde não há lei, não há ordem. A convivência em sociedade implica a existência de normas de conduta, que estabelecem procedimentos básicos para um relacionamento de respeito entre os indivíduos, e implica também a existência de leis, que regem as questões legais cíveis e criminais, as questões tributárias, administrativas, públicas, dentre um universo de aplicações.
Nenhuma novidade há nesta afirmativa. A questão é que para que indivíduos convivam em relativa harmonia e respeito é necessário que as normas de conduta sejam respeitadas e as leis sejam cumpridas. Sem essa condição básica, elementar, é inútil a existência de leis e dos órgãos públicos que deveriam zelar pela sua aplicação.
Um claro exemplo de leis que não são cumpridas é o trânsito de Lages. Por mais absurdo que possa parecer, uma das maiores cidades do estado não tem policiamento no trânsito. A situação, além de absurda, torna-se trágica, pois não há a menor preocupação entre os motoristas com relação a punição para qualquer atitude ilegal. Quando a lei é esquecida, esquece-se também o respeito, o senso crítico, a civilidade, a educação... Bem, na verdade, quando chega a este ponto é porque respeito e educação já foram esquecidos há muito tempo.
Os absurdos que acontecem não diferenciam motoristas de pedestres. Se você é motorista, terá que conviver com motoristas que bloqueiam a rua andando em velocidade irrisória, ou que ocupam as duas pistas das avenidas, motoristas que não sinalizam nem aos outros motoristas nem aos pedestres, motoristas que reagem tão lentamente ao sinal verde nos semáforos que poucas vezes passam mais que três carros por vez, motoristas que param em fila dupla em frente ao banco para que madames possam usar o caixa automático, como na Nereu Ramos em dias de chuva, motoristas que param seus carros ou ônibus em rua de pista única, como descendo a Frei Rogério sentido Centro–Pres. Vargas, para comprar jornal ‘bem rapidinho’, ou apanhar alunos em frente à escola, motoristas que conduzem veículos em frangalhos, sem a menor condição de segurança e trafegabilidade, colocando em risco sua própria integridade e dos demais motoristas e pedestres, motoristas que trafegam na contramão para não ter que dar a volta na quadra...
Se você é pedestre, terá que disputar espaço com carros ‘estacionados’ nas calçadas em frente às casas daqueles motoristas do parágrafo aí em cima, com carros atravessados em frente a estabelecimentos comerciais que usam a calçada como estacionamento para os clientes – experimente reclamar e será violentamente xingado como se o errado fosse você, com carros estacionados no que seria a calçada em postos de combustível, secando após a lavação enquanto aguardam seus proprietários vir buscá-los, com motos costurando entre os carros no trânsito, com bicicletas desviando das pessoas nas calçadas e calçadões e crianças e adolescentes em skates fazendo malabarismos, atropelando as pessoas e depredando prédios públicos e monumentos ao usá-los como rampas e obstáculos para sua diversão...
Isso tudo acontece sob o olhar complacente – e cúmplice por conseqüência – dos raros policiais que são vistos nas ruas. Quando a Polícia Militar era encarregada do policiamento do trânsito, alguns problemas e abusos também aconteciam, mas pelo menos havia a possibilidade dos transgressores serem punidos com multa ou apreensão do veículo, conforme o caso. Agora, nada é feito, nem pela Polícia Militar, nem pela Prefeitura, e essa omissão transforma o trânsito de Lages em terra de ninguém, e a cidade e seus cidadãos de bem permanecem reféns dos inescrupulosos e à mercê do acaso, e do descaso do Poder Público.